A generosidade do Papa
Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá
Apresentou-se certa vez, a Bento XIV, um pobre pai de família e, contando-lhe suas necessidades, pediu-lhe um auxílio.
- Tenho apenas vinte escudos – disse o Papa – se lhe bastam, dou-os com gosto.
Um jovem prelado, que estava presente, advertiu-o, em voz baixa, que vinte escudos eram demais, bastavam dez.
– O senhor tem dez escudos consigo? - Perguntou-lhe o Pontífice.
O
prelado, metendo a mão no bolso, apresentou-lhe dez escudos. Então o
Papa, entregando ao pobre seus vinte escudos com mais aqueles dez,
disse:
- Agradeça também ao Monsenhor, que concorre ao benefício, acrescentando à minha oferta a sua de dez escudos.
- O prelado ficou bastante desapontado, mas calou-se...
Uma
simples história de caridade, talvez um pouco forçada como a do
Monsenhor, acabou sendo mais uma ajuda para quem estava precisando.
O
evangelho deste domingo é um conjunto de palavras do Senhor Jesus, que
continua ensinando aos seus discípulos. Primeiro ele diz que ninguém
pode fazer milagres em seu nome e depois falar mal dele. O importante é
que “toda língua confesse que Jesus é o Senhor, para a glória de Deus
Pai” diz a carta aos Filipenses (2,11). No nome de Jesus só se deveria
fazer o bem a quem precisa - também se simples e, aparentemente,
insignificante como um copo de água. O escândalo acontece quando o nome
de Jesus é usado para prejudicar alguém ou dar vantagem a uns sobre
contra outros. Jesus não pode ser de parte. Por isso, os pequenos e os
pobres ficam escandalizados porque acreditam no amor do Pai para com
todos. Privilégios e enriquecimentos, usando o nome de Deus, só podem
desnortear a fé dos simples. Pensando bem, porém, todos os discípulos
verdadeiros deveriam ser os simples e pobres de coração que procuram
amar a Deus servindo ao seu próximo, com generosidade e desprendimento,
porque somente de Deus aguardam a recompensa.
Na
última parte do evangelho, encontramos aquelas palavras de Jesus que
não deixam de nos surpreender e incomodar. Entendemos que elas não devem
ser tomadas literalmente cortando mesmo mãos, pés e arrancando olhos.
No entanto, a decisão de mudar certas atitudes ou costumes nos custa
quase quanto arrancar membros do nosso corpo. Mais uma vez, devemos
entender as palavras de Jesus como um convite à liberdade. Liberdade
para amar e fazer o bem. Para possuir o grande tesouro que é “entrar no
reino de Deus” vale a pena renunciar não somente aos males, mas também a
outros “bens” menos valiosos. Não por desprezo ou heroísmo. Como
considerar inúteis uma mão, um pé ou um olho? Eles podem ser, porém,
obstáculos para a nossa participação no reino. A porta para entrar é
sempre estreita, precisa deixar fora muitas coisas. Sabemos que por
nosso orgulho, muitas vezes, custa-nos demais renunciar a uma ideia ou
uma opinião. Perdemos amizades, até a própria família, mas não admitimos
erros, não pedimos socorro para nos libertar de certos vícios que estão
grudados em nós, mais do que os membros do nosso corpo.
Achamos
tudo isso tão difícil e até inútil porque o reino do qual Jesus fala
nos parece tão longe! Por que deveríamos renunciar a algo bom para nós,
hoje, pensando num prêmio tão duvidoso no futuro? Na realidade o bem que
fazemos já é sinal e presença do reino. A renúncia a algo de menos
importância é para começarmos a ser felizes hoje, escolhendo a parte
melhor, aprendendo a amar, a servir, a nos doar. Ninguém aprende a fazer
isso de uma vez só, precisamos treinar também para amar, talvez com
pequenos gestos – o copo de água! – um sorriso, uma mão estendida, uma
ajuda a quem sofre.
Talvez
precisamos de alguém que nos empurre para doar. O Monsenhor da história
não ficou muito feliz por ter dado os dez escudos, mas já os tinha
entregado. Aprendeu com a lição do papa Bento XIV (14 mesmo), lá pelos
anos de 1700.
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