"Monsenhor Expedito comprou essa briga"
O Arcebispo de Natal, Dom Jaime Vieira Rocha, concluiu mestrado em Ciências da Religião e vai apresentar a dissertação à Banca Acadêmica na próxima sexta-feira, 6 de setembro, na UNICAP, em Recife (PE). Nesta entrevista concedida publicada no Jornal A Ordem - Jornal impresso da Arquidiocese - , ele explica por que decidiu fazer mestrado, mesmo com as inúmeras ocupações de bispo, e porque escolheu como tema o Mons. Expedito Sobral de Medeiros, um padre do clero da Arquidiocese de Natal.
Foto: Ândreson Madson
Jornal A Ordem: Dom Jaime, por que fazer mestrado em Ciências da Religião?
Dom Jaime: Eu passei parte do meu ministério episcopal na Diocese de Campina Grande, Paraíba, e ali me deparei com um fenômeno que me chamava a atenção, que era a forma como a cidade vivia o período carnavalesco. Enquanto noutras cidades era um período de intensa folia, em Campina Grande quase não havia carnaval. Isso porque, ali, começou a haver, há mais de 20 anos, um encontro sugerido pelo Bispo de então, Dom Luiz Gonzaga Fernandes, dentro de uma linha de ecumenismo, junto com o Pastor Neemias, de uma igreja evangélica do CONIC. Para ocupar o tempo do carnaval, eles organizaram um encontro que ficou conhecido como "Encontro da nova consciência". Era aberto, contando com as mais diversas manifestações religiosas: católicos, evangélicos, umbanda, budismo. Ali, todos se encontravam num clima bonito de ecumenismo, de respeito às diferenças e se cultivava um clima de paz, de diálogo e de entendimento. Com o crescimento, os evangélicos, criaram um encontro paralelo, de âmbito nacional, com o título de Nova Consciência Cristã. Depois, também surgiram o encontro para a Torah, com os descendentes dos judeus, e dos espíritas. A Igreja Católica, com o novo viés surgido com a Renovação Carismática, também passou a realizar o encontro Crescer. De modo que o Bispo era sempre convidado a participar e eu passei a conviver com esta realidade do pluralismo religioso. Então, vi que era um fenômeno que poderia ser aprofundado, e que as Ciências da Religião dariam uma contribuição para que pudéssemos entender melhor e ter uma visão mais aberta de todo este fenômeno. Veio, então, a oportunidade de fazer um mestrado, junto com um grupo de Natal, em Ciências da Religião, e, para mim, foi muito gratificante, por causa daquela realidade que vivi em Campina Grande, e também para a nossa visão de Igreja.
Dom Jaime: Eu passei parte do meu ministério episcopal na Diocese de Campina Grande, Paraíba, e ali me deparei com um fenômeno que me chamava a atenção, que era a forma como a cidade vivia o período carnavalesco. Enquanto noutras cidades era um período de intensa folia, em Campina Grande quase não havia carnaval. Isso porque, ali, começou a haver, há mais de 20 anos, um encontro sugerido pelo Bispo de então, Dom Luiz Gonzaga Fernandes, dentro de uma linha de ecumenismo, junto com o Pastor Neemias, de uma igreja evangélica do CONIC. Para ocupar o tempo do carnaval, eles organizaram um encontro que ficou conhecido como "Encontro da nova consciência". Era aberto, contando com as mais diversas manifestações religiosas: católicos, evangélicos, umbanda, budismo. Ali, todos se encontravam num clima bonito de ecumenismo, de respeito às diferenças e se cultivava um clima de paz, de diálogo e de entendimento. Com o crescimento, os evangélicos, criaram um encontro paralelo, de âmbito nacional, com o título de Nova Consciência Cristã. Depois, também surgiram o encontro para a Torah, com os descendentes dos judeus, e dos espíritas. A Igreja Católica, com o novo viés surgido com a Renovação Carismática, também passou a realizar o encontro Crescer. De modo que o Bispo era sempre convidado a participar e eu passei a conviver com esta realidade do pluralismo religioso. Então, vi que era um fenômeno que poderia ser aprofundado, e que as Ciências da Religião dariam uma contribuição para que pudéssemos entender melhor e ter uma visão mais aberta de todo este fenômeno. Veio, então, a oportunidade de fazer um mestrado, junto com um grupo de Natal, em Ciências da Religião, e, para mim, foi muito gratificante, por causa daquela realidade que vivi em Campina Grande, e também para a nossa visão de Igreja.
Jornal A Ordem:Por que escolheu o tema Monsenhor Expedito Sobral de Medeiros para sua dissertação de Mestrado.
Dom Jaime: Meu ponto de partida da pesquisa, inicialmente, seria um estudo tentando preservar a memória dos encontros de bispos do Nordeste, em 1956, em Campina Grande, cuja memória resgatei, em 2006, quando cheguei lá, celebrando os 50 anos; e, em Natal, em 1959, o segundo encontro, que resultou em 16 decretos do governo Juscelino Kubstchek, com medidas pontuais para cada Estado do Nordeste, e, aqui em Natal, quando se deu o complemento maior, com a criação da SUDENE. Eu queria me voltar para este período histórico da Igreja, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das pessoas e o desenvolvimento do Nordeste. Então, o meu orientador sugeriu que eu poderia tomar como objeto da dissertação nesse contexto de Igreja no Brasil, como o Encontro dos Bispos. Era um tema que também me interessava; o tema da seca para mim era palpitante, como nordestino que sou. Achei boa a sugestão, abracei o projeto e estou vendo como tem sido oportuno e válido me dedicar à memória do Mons. Expedito Sobral de Medeiros. O tema, agora já na fase final, para apresentar a dissertação, é este: "Monsenhor Expedito Sobral de Medeiros: um arauto da dignidade humana no sertão potiguar". Isso, para mim, tem sido muito válido, porque é também a oportunidade para resgatar a memória de alguém que tem tanto a oferecer como legado, a nós padres e bispos da Igreja.
Dom Jaime: Meu ponto de partida da pesquisa, inicialmente, seria um estudo tentando preservar a memória dos encontros de bispos do Nordeste, em 1956, em Campina Grande, cuja memória resgatei, em 2006, quando cheguei lá, celebrando os 50 anos; e, em Natal, em 1959, o segundo encontro, que resultou em 16 decretos do governo Juscelino Kubstchek, com medidas pontuais para cada Estado do Nordeste, e, aqui em Natal, quando se deu o complemento maior, com a criação da SUDENE. Eu queria me voltar para este período histórico da Igreja, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das pessoas e o desenvolvimento do Nordeste. Então, o meu orientador sugeriu que eu poderia tomar como objeto da dissertação nesse contexto de Igreja no Brasil, como o Encontro dos Bispos. Era um tema que também me interessava; o tema da seca para mim era palpitante, como nordestino que sou. Achei boa a sugestão, abracei o projeto e estou vendo como tem sido oportuno e válido me dedicar à memória do Mons. Expedito Sobral de Medeiros. O tema, agora já na fase final, para apresentar a dissertação, é este: "Monsenhor Expedito Sobral de Medeiros: um arauto da dignidade humana no sertão potiguar". Isso, para mim, tem sido muito válido, porque é também a oportunidade para resgatar a memória de alguém que tem tanto a oferecer como legado, a nós padres e bispos da Igreja.
Jornal A Ordem: Na trajetória de vida do Mons. Expedito, o que o senhor destaca como mais valioso?
Dom Jaime: Foi a sua coerência, no que diz respeito ao zelo pelo testemunho de padre e de homem fiel à Igreja e também, voltado para a dignidade da pessoa humana. Ele parte muito para a motivação de atenção ao nordestino, a partir de uma visita que o então Dom Eugênio de Araújo Sales, então Bispo auxiliar, em 1958, com um grupo de padres, foram visitar as obras do açude do Pataxó, no vale do Açu. Ele conta que, quando chegaram lá, naquele sol a pino, poeira, a multidão de cassacos, flagelados, construindo aquele açude, sob o regime de barracão, entregues aos coronéis, quase não pegavam em dinheiro, tinham que receber em alimentos; era como se fosse uma escravidão. Um dos cassacos dirigiu-se ao Mons. Expedido, à sombra de um juazeiro, e pediu: "Seu vigário, tire nós desse inferno, pelo amor de Deus". O Mons. Expedito, como se diz na linguagem nordestina, "comprou essa briga", por essa defesa daqueles nordestinos. Outro fato, foi esse: na década de 70, ele organizou uma excursão, num fusca, junto com outros padres, e foi à Transamazônica visitar os paroquianos de São Paulo do Potengi, que tinham ido para escapar da seca nordestina. Chamou a minha atenção essa atitude profética dele e o zelo pela dignidade humana e também tudo que fazia numa linha de consciência política e social. Ele era a presença da Igreja para levar as pessoas a encontrar a sua dignidade.
Dom Jaime: Foi a sua coerência, no que diz respeito ao zelo pelo testemunho de padre e de homem fiel à Igreja e também, voltado para a dignidade da pessoa humana. Ele parte muito para a motivação de atenção ao nordestino, a partir de uma visita que o então Dom Eugênio de Araújo Sales, então Bispo auxiliar, em 1958, com um grupo de padres, foram visitar as obras do açude do Pataxó, no vale do Açu. Ele conta que, quando chegaram lá, naquele sol a pino, poeira, a multidão de cassacos, flagelados, construindo aquele açude, sob o regime de barracão, entregues aos coronéis, quase não pegavam em dinheiro, tinham que receber em alimentos; era como se fosse uma escravidão. Um dos cassacos dirigiu-se ao Mons. Expedido, à sombra de um juazeiro, e pediu: "Seu vigário, tire nós desse inferno, pelo amor de Deus". O Mons. Expedito, como se diz na linguagem nordestina, "comprou essa briga", por essa defesa daqueles nordestinos. Outro fato, foi esse: na década de 70, ele organizou uma excursão, num fusca, junto com outros padres, e foi à Transamazônica visitar os paroquianos de São Paulo do Potengi, que tinham ido para escapar da seca nordestina. Chamou a minha atenção essa atitude profética dele e o zelo pela dignidade humana e também tudo que fazia numa linha de consciência política e social. Ele era a presença da Igreja para levar as pessoas a encontrar a sua dignidade.
Jornal A Ordem: O senhor, já Arcebispo, 65 anos, preocupado com a formação intelectual. Neste sentido, que mensagem o senhor deixa para os Padres, principalmente os mais jovens?
Dom Jaime: Vejo, com muita alegria, graças a Deus, que este meu gesto, a decisão de fazer esse curso, despertou junto ao clero, aqui em Natal e em Campina Grande, a motivação para vários sacerdotes também fazerem reciclagem ou outro curso superior. Muitos em Pedagogia, Ensino Religioso, Ciências da Religião. Vi que isto foi muito edificante. Nossos atos, se são edificantes e bons, chamam a atenção e motivam outras pessoas. Aqui mesmo, em Natal, vejo com muita alegria vários sacerdotes concluindo seus cursos de pós-graduação ou mesmo mestrado ou graduação em Direito. Hoje, a sociedade é bastante exigente. Para que possamos entendê-la e dialogar mais com este tempo, precisamos nos reciclar, sobretudo dentro desses aspectos da Ciência, da Religião, da Sociologia, da Política, cursos todos que nos ajudam a entender melhor o fenômeno, não só religioso, mas da sociedade atual.
Dom Jaime: Vejo, com muita alegria, graças a Deus, que este meu gesto, a decisão de fazer esse curso, despertou junto ao clero, aqui em Natal e em Campina Grande, a motivação para vários sacerdotes também fazerem reciclagem ou outro curso superior. Muitos em Pedagogia, Ensino Religioso, Ciências da Religião. Vi que isto foi muito edificante. Nossos atos, se são edificantes e bons, chamam a atenção e motivam outras pessoas. Aqui mesmo, em Natal, vejo com muita alegria vários sacerdotes concluindo seus cursos de pós-graduação ou mesmo mestrado ou graduação em Direito. Hoje, a sociedade é bastante exigente. Para que possamos entendê-la e dialogar mais com este tempo, precisamos nos reciclar, sobretudo dentro desses aspectos da Ciência, da Religião, da Sociologia, da Política, cursos todos que nos ajudam a entender melhor o fenômeno, não só religioso, mas da sociedade atual.
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