Internet na vida sacerdotal
Um curso orienta seminaristas sobre a atitude que se deve ter no uso da rede
José Antonio Valera Vidal
A
imagem projetada é a de um jovem casal que está se olhando. Ambos estão
tristes, enquanto ela reclama que lhe falta atenção. Em seguida, ele
coloca a mão sobre a dela e vira-a de um lado para o outro, de modo
mecânico, para depois fazer “dois cliques” como único carinho... O
público ri. Com este pequeno vídeo de motivação – também de constatação -
, foi inaugurado hoje o seminário “internet na vida do presbítero”,
organizado pelo Instituto de Terapia Cognitivo Interpessoal de Roma e o
Pontifício Colégio Internacional “Mater Ecclesiae”.
Serão dois
dias para estudar os benefícios e também os riscos do uso da internet na
formação dos seminaristas, bem como na forma como se deve lidar com os
“novos” pecados dos usuários, que fizeram da “rede” um espaço
desordenado para a sua vida afetiva, laboral e moral.
De acordo com a Dra. Michela Pensavalli, psicóloga e psicoterapeuta,
bem como professora universitária e coordenadora do Instituto promotor
do evento, é muito importante que a pessoa - neste caso o seminarista -,
analise e se responda se é ou não "dependente" da Internet . Ou seja,
se consegue dominar as emoções e impulsos que os sites e as redes
sociais geram, seja quando se está conectado, como também quando se deve
passar longos períodos off line.
Para a especialista, o domínio e o equilíbrio é vital, porque em uma
sociedade "Tecnolíquida", segundo a definição recente do psiquiatra
italiano, Tonino Cantelmi, os diversos dispositivos podem manter as
pessoas em uma conectividade permanente, onde é difícil distinguir os
limites ou o tempo passado, em detrimento de outros fins ou obrigações.
A teoria do "tudo e rápido"
Outro risco que o navegante moderno encontra, é a tendência a
encurtar as coisas e evitar os encontros. Ou seja, se por uma mensagem
de texto podemos explicar alguma coisa rapidamente, por que estender-se
ou aprofundar? Ou pior ainda, se temos tantas plataformas de comunicação
instantânea, para que encontrar-nos?
Também o usuário, na sua necessidade de estar conectado, pode perder a
atenção do que as pessoas lhe falam, por exemplo, numa aula ou
conferência, por estar pendente do modo rapidíssimo de como continuam a
interagir os seus contatos e listas de interesses “lá fora”.
O fato de não poder se desconectar (switch off), já é um sinal de que
deve ser observado... Porque nem hoje e nem no passado, foi possível
estar num lugar e ao mesmo tempo em outro –fora – , não porque a
internet não te deixe fazer isso, mas porque as normas básicas de
convivência ou da vida comunitária te exigem. Mas para alguns – isso sim
é de ontem e de hoje - , sua necessidade pessoal está por acima da dos
demais, o que é um mau sinal...
O que mais oferece a Internet? Segundo a doutora Pensavalli, te
oferece emoções – até mesmo fortes – relações – não sem perigos – , e te
facilita as coisas para sair do “tédio”. Para outros, o tempo passa
mais rápido conectando-se à rede, por tanto ajuda a evadir-se; enquanto
que para um grupo de usuários é a porta entre o privado e o público,
cuja chave se abre ou fecha de acordo com a conveniência ou a vontade.
Sobre isso, foi clara em advertir que, como emissor e dono das suas
conexões de internet, o usuário se predispõe a evitar o que ele não
gosta, e a eleger só aquilo que não lhe chateia; assim como selecionar o
que não lhe coloque tenso e nem lhe faça refletir muito. Ou seja, a
ambivalência toma conta da pessoa, e assim quando se vivem as relações
humanas, e diante de uma situação real de convivência, em que se exige
mais da mesma pessoa, chega-se a acreditar que é hora de “desligar a
conexão” e basta...
Amizades perigosas
Tudo na internet parece tão fácil e acessível, que o usuário começa a
clicar onde não deveria se aproximar nem um pouquinho, ou a “aceitar”
convites de amigos que não tem nem a menor ideia de quem sejam.
Na internet todo mundo é igual, pelo menos, naqueles locais de acesso
público e gratuito. Mas nem todos somos o mesmo, foi outra ideia da
doutora Michela Pensavalli, pois as redes fazem surgir na pessoa o seu
lado mais narcisista, exibicionista e sem dúvida, o voyeurista.
Somos assim nas relações cotidianas, por assim dizer, física? Na
verdade não, de modo que o uso compulsivo da rede (líquido, sem padrões
ou limites), às vezes nos obriga a mudar de atitude para interagir, de
tal forma que aparecem também tendências patológicas ...
Só para citar os graus mais baixos de cada tendência – porque os mais
altos são para correr deles - , pode-se identificar o narcisismo só no
fato de colocar a “melhor foto” no perfil de uma rede social, tanto faz
se é antiga ou que não esteja de acordo com a realidade atual (foto sem
camisa clerical, sem a família, no exterior).
No caso de exibicionismo, aí estão as conquistas ou os comentários
expressos sem medida, só pelo fato de que podemos também incluí-los nas
nossas contas, independentemente de se os outros querem tanto bombardeio
“made em mim mesmo”.
E uma terceira tendência comentada pela especialista – não menos
grave, dependendo da pessoa – é o voyeurismo, ou essa antiga obsessão
por olhar sem que nos vejam; ainda que hoje em dia, graças à Internet,
pode-se fazer de modo consentido, falsificado ou pago sem controles. Ela
alertou para o alto consumo do chamado "cybersexo", que de acordo com
dados dos EUA, no mundo, consome-se 3.000 dólares de pornografia por
segundo.
É necessário considerar, portanto, o risco que significa que uma
pessoa possa ser o oposto a si mesma na rede, distanciando-se dos seus
princípios, obrigações e faltando com a confiança dos superiores. Pois
muitas vezes estes toleram o uso da internet com a esperança de que
ajude para aprofundar no estudo, para combater a distância recebendo
mensagens dos familiares e amigos de bem, ou para dar os "primeiros
passos" de uma futura e urgente pastoral na rede.
Uma conclusão clara foi que o mundo atual do ciberespaço, é um mundo
onde se pode viver, mas cuidando a qualidade do uso que se faz e não
deixando-se dominar pelos impulsos que este gera. E, assim com ontem,
não confundir nunca o instrumento com a mensagem...
(Trad.TS) (Fonte: ZENIT)