Carta da sociedade civil em apoio à desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé
Ilma. Sra. Dilma Rousseff
Presidente da República Federativa do Brasil
Ilma. Sra. Gleisi Hoffmann
Ministra-Chefe da Casa Civil
Ilmo. Sr. Eduardo Cardozo
Ministro da Justiça
Ilma. Sra. Marta Azevedo
Presidente da Fundação Nacional do Índio
Ilmo. Sr. Carlos Guedes
Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
Vimos
expressar que a desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé, determinada
nesta semana pelo ministro Carlos Ayres Britto, Presidente do Supremo
Tribunal Federal, foi uma medida muito aguardada e comemorada por
diversos setores da sociedade civil brasileira que acreditam no papel da
Justiça diante das manobras falsas e inescrupulosas de políticos e
ruralistas que apoiam a permanência de invasores na Terra Indígena
Marãiwatsédé. A área tem sido devastada em quase 90% de sua extensão
para conversão da vegetação nativa em pastagens e lavouras de grãos de
forma escandalosa, apesar de ali se encontrar uma terra indígena
demarcada e homologada pela União desde 1998 – o que faz deste um dos
casos mais emblemáticos de defesa dos direitos humanos e territoriais
indígenas da História recente do Brasil.
Mesmo
com diversas decisões favoráveis da Justiça, reconhecendo a má-fé dos
invasores, rejeitando qualquer possibilidade de indenização e
ressaltando o direito do povo Xavante ao seu território tradicional – de
onde foram expulsos em 1966 pela ditadura militar para permitir a
instalação do latifúndio conhecido como Suiá-Missu – a sociedade
brasileira espera que o governo federal mantenha firmeza, vontade
política e agilidade suficientes para implementar o plano de desintrusão
da área imediatamente. Depois de pressões dos Xavante que vivem na
Terra Indígena Marãiwatsédé, esse documento foi elaborado e apresentado
pela FUNAI em agosto de 2012, vinte anos depois da promessa de devolução
do território aos Xavante durante a Eco92.
Durante
todos esses anos foram diversos os recursos que atrasaram o processo em
desfavor dos indígenas, quando desembargadores federais suspenderam o
andamento da desintrusão ao dar crédito a uma proposta inconstitucional
feita por deputados e pelo governador de Mato Grosso, que ofereceram em
permuta à FUNAI o Parque Estadual do Araguaia e mais R$ 5 milhões para
bancarem a transferência dos indígenas. Tal proposta foi feita em nome
dos Xavante de Marãiwatsédé sem qualquer consulta à comunidade que
reside em cerca de 10% do território para ela homologado há 14 anos.
Tudo
isso para permitir a continuidade das atividades ilegais, já conhecidas
pelo governo por meio de operações do IBAMA, que embargou 132 mil
hectares em Marãiwatsédé e aplicou multas que somam mais de R$ 100
milhões.
Agora,
com a desintrusão novamente autorizada pelo Presidente do Supremo
Tribunal Federal e com a manutenção da presença de forças do governo
para garantir a realização das notificações e retirada de ocupantes de
dentro da Terra Indígena Marãiwatsédé, entendemos que os Xavante que ali
vivem precisam de reforços em sua segurança, ao passo que se esgotam as
possibilidades de recursos judiciais por parte dos fazendeiros que
invadiram Marãiwatsédé. Eles, declaradamente, contam com o apoio do
governo do estado de Mato Grosso para resistirem à estratégia de
remoção, quando a posição do governo deveria ser de suporte à decisão
judicial.
Apoiados
por lideranças políticas do Mato Grosso no Congresso Nacional, na
Assembleia Legislativa e no governo estadual, os invasores de
Marãiwatsédé já se valeram de bloqueios de estradas, do recrudescimento
de ameaças (inclusive de morte), e do convencimento da opinião pública
se utilizando de informações falsas sobre o número de ocupantes
não-indígenas, jamais checadas pela imprensa.
Nos
últimos meses, propalou-se a falsa informação de que 7 mil pessoas
seriam retiradas da terra indígena em benefício de 350 indígenas,
segundo divulgado pelos advogados dos ruralistas nos meios de
comunicação. Um cruzamento simples de dados do Censo 2010 aferidos pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que,
somando a população rural dos municípios de Alto Boa Vista, São Félix do
Araguaia e Bom Jesus do Araguaia, existem 9.180 pessoas. Ou seja,
apenas 2.180 moradores (23,74%) estariam fora da TI Marãiwatsédé, o que é
uma gritante inverdade.
Pode-se
chegar a números ainda menores calculando-se proporcionalmente a
quantidade por município daqueles que residiriam em Marãiwatsédé: algo
muito aquém das supostas 7 mil. Este número engana a população e a
demora pela desintrusão custa aos Xavante de Marãiwatsédé o agravamento
das suas condições de vida. Os indígenas estão fragilizados pela água
poluída que consomem e pelos poucos recursos nutricionais disponíveis,
uma vez que não têm segurança para frequentar outros locais importantes
de seu território.
Em
relação às famílias de pequenos agricultores que vivem dentro da Terra
Indígena Marãiwatsédé e foram identificadas pelo INCRA como clientes da
reforma agrária, cerca de 400, fica a cobrança de que sejam tratados com
o respeito e dignidade, sendo assentadas em local onde possam realizar
suas atividades produtivas com qualidade.
Confiantes
no papel do governo e da Justiça na garantia da integridade física e
territorial do povo Xavante de Marãiwatsédé, os abaixo-assinados apoiam a
DESINTRUSÃO JÁ!
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
Terra de Direitos
Fórum de Diretos Humanos e da Terra MT
Plataforma de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientes (Plataforma Dhesca Brasil)
Articulação Xingu-Araguaia
Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB)
Operação Amazônia Nativa (OPAN)
Associação de Defesa Etnoambiental (Kanindé)
Greenpeace
Conselho Indigenista Missionário – Regional Mato Grosso (Cimi)
Comissão Pastoral da Terra (CPT MT)
Centro Burnier de Fé e Justiça
Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad)
Instituto Caracol (iCaracol)
Instituto Centro de Vida (ICV)
Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Artes (GPEA/UFMT)
Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental (Remtea)
Grupo de Trabalho Mobilização Social (GTMS)
Sociedade Fé e Vida
Grupo Cultural e Ambiental Raízes
Fórum de Lutas e Entidades de Cáceres (Flec)
Vídeo nas Aldeias
Comunidade Eclesial de Base (CEB MT)
Ecotrópica – Fundação de Apoio à Vida nos Trópicos
FASE MT