O
ser humano traz em si a percepção quase que instintiva da existência de
um Deus bom, reto, justo e santo. A própria natureza clama por um
Criador e Ordenador de todas as coisas. Sim, pode ter certeza: existe
Alguém, um Deus do qual tudo provém. Mas, não basta afirmar isto. Tem
mais: esse Deus misterioso que o coração humano procura de tantos modos e
que cada religião vislumbra como que às apalpadelas, Ele mesmo saiu do
Seu silêncio; Ele falou, veio ao encontro da Sua criatura, estendeu as
mãos e abriu o coração à humanidade toda. Esta é a fé dos judeus e, de
modo mais específico, a certeza dos cristãos: Deus dirigiu-Se ao homem
para partilhar Sua vida conosco e nos chamar a uma vida plena na amizade
com Ele. Fomos criados para Ele e Nele somente seremos plenos. Por
isso, Ele veio ao nosso encontro! Se pensarmos bem... Que mistério tão
grande: o Infinito sair do Seu silêncio e nos dirigir a Sua palavra,
ocupar-Se conosco! Mas, como foi isso?
As
Sagradas Escrituras são testemunhas desse misterioso diálogo entre Deus
e a humanidade. Mas, compreendamos logo algumas coisas. (1) Deus não Se
revelou primeiramente num livro. Revelou-Se na história de um povo, por
Ele misteriosa e gratuitamente escolhido: o povo de Israel. Pouco a
pouco, com admirável pedagogia, foi plasmando esse povo, foi a ele Se
revelando, retirando-o do paganismo, educando-o; foi-lhe purificando a
consciência, refinando a percepção que eles tinham o divino. Aos poucos,
Israel foi se formando, foi compreendendo que havia sido escolhido e,
dessa escolha, dependia também a bênção para toda a humanidade. E Israel
foi experimentando, foi tomando consciência de que esse seu Deus não
era um deus entre outros, mas Deus, simplesmente o Deus, o Eterno, o
Invisível, o Santo, o Único! Nos percalços da história, o Senhor foi
educando Israel para acolher a Sua revelação. (2) Atenção, que
“revelação” aqui não quer dizer revelação de segredos e ideias
abstratas, de teorias, mas se trata da revelação de Alguém, revelação do
próprio Deus: como um amigo se revela a outro amigo, como o amado se
revela à sua amada em palavras, em gestos, em atitudes, em convivência,
assim Deus, o Altíssimo, foi Se revelando ao Seu povo. (3) Somente num
segundo momento é que os sábios e profetas, os escribas e sacerdotes
foram colocando por escrito a história de Israel: suas histórias, suas
tradições, séculos e séculos de vida com o seu Deus, vida que muito
antes havia experimentado na existência sofrida de cada dia. Então, uma
conclusão importante: os textos da Escritura não são simples documentos
históricos crus, impessoais, simplesmente objetivos, crônicas de jornal
ou informação de livro de história! Nada disso: são textos vivos, textos
vividos, cheios de emoção, de paixão: são o testemunho de como um povo
vivenciou no seu coração e na sua vida o seu relacionamento com o Deus
vivo que lhe veio ao encontro nos acontecimentos da sua história.
Imagine alguém colocando por escrito sua vida com a pessoa amada, sua
história de amor com tantos altos e baixos... Assim Israel colocou por
escrito essa relação do Deus Amante com o Seu povo amado... É isto o
conjunto de textos a que chamamos Antigo Testamento. (4) E Israel foi
crescendo na convicção de que esses textos tão humanos, com linguagem de
homens, não eram simplesmente obra de homens: por trás dos autores
humanos, era Deus mesmo quem estava inspirando, comunicando-Se, rasgando
Seu coração para que o homem nele pudesse entrar!
Pois,
meu Leitor, são esses textos benditos que compõem o nosso Antigo
Testamento; textos que contêm a Palavra de Deus tanto para os judeus
como para os cristãos. Mas, qual o enredo desses textos, desses livros
que são as Escrituras Santas de Israel? O que dizem? O que prometem? O
que ensinam a esperar? Para onde nos orientam?
Procuram
mostrar que Deus tem um plano de amor e salvação para toda a
humanidade. Desse modo, a Escritura garante que desde o princípio Deus
foi Se manifestando aos homens e os homens foram dizendo-Lhe “não”! Como
assim? Na sua vida, na sua consciência, nas suas escolhas, o homem foi
sempre tentado a pensar: “A vida é minha: eu sei o que é melhor para
mim, eu faço como eu quero!” E Deus teimando em nos dirigir Seu apelo no
íntimo da nossa consciência, persistindo no Seu amor. Podemos encontrar
isto em histórias que o povo contava, como as parábolas de Jesus,
cheias de vida e de sabedoria: Adão e Eva, criados à imagem de Deus, o
pecado de querer ser seu próprio deus, o mal se espalhando na
humanidade, o dilúvio com o qual Deus mostra que não se contenta com o
mal, mas dá sempre uma nova chance à humanidade... Assim, as Escrituras
desejam mostrar que Deus ama a todos os seres humanos e deseja a
salvação de todos... E mostra também como o homem foi e vai fabricando
deuses, ídolos aos quais se apegar, nos quais colocar a segurança,
fugindo do Deus vivo e verdadeiro que lhe fala na voz da consciência e o
visita na saudade do seu coração desejoso de vida, verdade e paz...
Quer aprofundar isso? Veja no Catecismo da Igreja Católica, nos números
50-58...


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